terça-feira, 17 de novembro de 2009

Uma Burca para Geisy - Miguezim de Princesa








Eu estava querendo muito escrever um texto sobre essa farta ou falta polêmica em relação ao "uso ético" das roupas em centros de ensino.

Faltava inspiração, a polêmica foi escorregando para os cantinhos dos jornais, nem uma notinha, nada mais.

Quando estou atrasado em uma semana para posta algo, eis que me aparece essa ladinha muito bacaninha vinda diretamente do Sertão de PE, homofobica e machista por deveras, mas causa uma discussão que ligou o sudeste ao sertão.


Ficam as provocações...


UMA BURCA PARA GEISY - Miguezim de Princesa

I
Quando Geisy apareceu
Balançando o mucumbu
Na Faculdade Uniban,
Foi o maior sururu:
Teve reza e ladainha;
Não sabia que uma calcinha
Causava tanto rebu.

II
Trajava um mini-vestido,
Arrochado e cor de rosa;
Perfumada de extrato,
Toda ancha e toda prosa,
Pensou que estava abafando
E ia ter rapaz gritando:
"Arrocha a tampa, gostosa!"

III
Mas Geisy se enganou,
O paulista é acanhado:
Quando vê lance de perna,
Fica logo indignado.
Os motivos eu não sei,
Mas pra passeata gay
Vai todo mundo animado!

IV
Ainda na escadaria,
Só se ouvia a estudantada
Dando urros, dando gritos,
Colérica e indignada
Como quem vai para a luta,
Chamando-a de prostituta
E de mulherzinha safada.

V
Geisy ficou acuada,
Num canto, triste a chorar,
Procurou um agasalho
Para cobrir o lugar,
Quando um rapaz inocente
Disse: "oh troço mais indecente,
Acho que vou desmaiar!"

VI
A Faculdade Uniban,
Que está em último lugar
Nas provas que o MEC faz,
Quis logo se destacar:
Decidiu no mesmo instante
Expulsar a estudante
Do seu quadro regular.

VII
Totalmente escorraçada,
Sem ter mais onde estudar,
Geisy precisa de ajuda
Para a vida retomar,
Mas na novela das oito
É um tal de molhar biscoito
E ninguém pra reclamar.

VIII
O fato repercutiu
De Paris até Omã.
Soube que Ahmadinejad
Festejou lá no Irã,
Foi uma festa de arromba
Com direito a carro-bomba
Da milícia Talibã.

IX
E o rico Osama Bin Laden,
Agradecendo a Alá,
Nas montanhas cazaquistãs
Onde foi se homiziar
Com uma cigana turca,
Mandou fazer uma burca
Para a brasileira usar.

X
Fica pra Geisy a lição
Desse poeta matuto:
Proteja seu bom guardado
Da cólera dos impolutos,
Guarde bem o tacacá
E só resolva mostrar
A quem gosta do produto.

domingo, 8 de novembro de 2009

Meus personagens - Por Braulio Tavares








Esse cara para mim é o melhor escritor e intelectual vivo do Brasil, entrei em contato com Bráuliio Tavares através da música, para ser exato, quando comprei um CD de Lenine e me vi encantado pela música e título do CD "O dia em que faremos contato" - um trecho dela:
"A nave quando desceu, desceu no morro
Cheia de ETs vestidos de Orixá
Vieram pedir socorro
E se derem vez ao morro
Todo o universo vai sambar"

Depois fique fã da coluna praticamente diária no Jornal da Paraíba, a qual tento acompanhar pelo menos nos domingos de chão frio e sol quente dentro do apartamento planejando um monte de coisa que não irei fazer.

Descobri com o tempo que muita coisa das quais eu gosto musicalmente ou textualmente são obras ou referências de Braulio Tavares.

Algumas vezes penso que Braulio Tavares e outros que estão nessa foto acima poderiam ser um personagem meu...kkkkk...mera ilusão e pretensão, mas que é divertido pensar isso é...rs


Texto - Meus Personagem - Braulio Tavares (Domingo 08.11.09 - Jornal da PAraíba)

Sob um sol de rachar em São Paulo, às 16h, eu caminhava subindo a Bela Cintra. Ao parar num sinal olhei para dentro do boteco ao lado. Lugar mambembe, moscas, luzes fluorescentes. Mesas de fórmica, quase todas vazias. Numa delas, um homem de meia idade, num terno elegante, aparência abatida, palitava os dentes diante de um prato agora vazio. Reconheci-o: era um personagem meu, Ambrósio Ramos. Cinquenta e seis anos, desempregado, procura trabalho como um louco antes que a mulher desconfie do que está acontecendo. Foi despedido de uma multinacional onde ganhava 30 mil por mês e gastava 40. Desde janeiro está na rua.

É um guerreiro. Degustador de bons vinhos, só o faz agora em casa, enquanto dura a adega. Na rua, quando vai levar currículo de escritório em escritório, almoça um PF com guaraná. Não tem como pedir à esposa que gaste menos. Prefere a morte. Na verdade, no momento em que meus olhos cruzaram com os seus, percebi a serena certeza que o invadia, e a terrível resolução. Não havia outro caminho. Afastei os olhos, angustiado. Virei na direção da Haddock Lobo, fiz algumas compras na Bella Paulista (minha padaria favorita) e voltei devagar.

Ao passar por lá olhei de novo, e tive uma surpresa. Uma bela mulata, de vestido curto, estampado, estava sentada na mesa de frente para ele. Ela tomava um chope e ele uma água mineral. Os dois sorriam, animados... Como pude me confundir tanto? Ele é Ronald Seedorf, jornalista holandês de passagem por Sampa. Marcou encontro com uma “escort” ali, o bar mais próximo do hotel em que se hospedava. Queria conversar, quebrar o gelo, para que quando chegassem ao elegante saguão das suítes já houvesse entre os dois o confortável misto de intimidade e curiosidade que precede o sexo. Ronald escreve sobre economia e finanças. Conhece o Brasil há anos, e adora as mulheres brasileiras. Acha que são coquetes sem artificialismo, conseguem ser sensuais e alegres ao mesmo tempo (ao contrário das holandesas), conversam sem receio sobre qualquer assunto, mesmo que não entendam...

Vou descendo a rua e paro numa sorveteria. Peço um de maracujá com amora. Fico me deliciando, e, quando estou no final, quem vejo? O casal desce a rua e pára bem ali, fazendo sinal para um táxi. Entreouço frases cordiais de despedida, um aperto de mão cordial mas distante, ela entra sozinha no banco de trás... Agora entendi quem é ele. Chama-se Pepe Borriello, mora em Curitiba, e é o sogro dela. A mulata trabalha numa entidade ambiental, casou com o filho dele há um ano. Ele lhe trouxe recados e alguma pequena encomenda; ela marcou o encontro ali. Ele escreve ficção científica nas horas vagas (é dentista) e vai embora devagar, imaginando um planeta em que a pele das pessoas muda de cor de acordo com seu estado de espírito, de modo que elas são negras quando estão dançando e se divertindo, e brancas quando estão sonhando com a dor e a felicidade alheias.